segunda-feira, 27 de agosto de 2012

festa no apê do hospital

Eu queria abrir este post com um palavrão bem grande, mas ia ficar deselegante. No entanto, apesar da minha decisão de não escrever literalmente o que está na minha cabeça, preparem-se: o que vem a seguir não é muito mais elegante.
Mães sem noção estão ultrapassando todos os limites e fazendo festinhas na maternidade, com direito a garçom, champanhe e tudo mais. Não é mais uma ou outra artista sem noção, tá virando moda, segundo reportagem da revista Veja.
Naquele momento em que a mãe deveria estar descansando com seu bebê, contando os dedinhos; no momento em que lhe é "permitido" estar inchada, descabelada e sem maquiagem para pensar apenas na sensacional experiência de trazer ao mundo uma pessoinha que deveria, então, ser o centro do seu mundo; nesse momento elas fazem invadir a maternidade, maquiador, cabelereiro, buffet, garçom, fotógrafo e sei lá quantas pessoas mais para se exibir. (http://vejario.abril.com.br/edicao-da-semana/festa-na-maternidade-699200.shtml).
Sim, isso é exibicionismo puro! É querer mostrar que pode.
É como as mega produções das festas de aniversário de um ano, mas com um agravante: é feito dentro de um hospital, com o aval da direção do hospital, ignorando a necessidade do bebê recém nascido de estar tranquilo ao lado dos pais.
A festinha de aniversário pode ser exagerada, eu não tenho nada com isso e nada contra isso. Eu não faria, mas se os pais têm dinheiro e querem fazer, problema deles. Mas isso de encher a maternidade de gente, comida, decoração e, principalmente, bebida, no primeiro dia de vida do bebê, é absurdo!
Mais absurdo: os hospitais permitem esse circo todo, mas não permitem que uma doula acompanhe a parturiente na sala de parto. O Conselho de Medicina e a direção dos hospitais deixam entrar câmera fotográfica, filmadora, pai que desmaia, mãe que chora, irmã que trava de nervoso, um monte de gente sem o menor preparo para este momento, mas não permite que uma pessoa treinada para ajudar - e igualmente escolhida pela mãe - entre na sala de parto.
Dá pra entender?

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Não, obrigada!

Já aconteceu comigo algumas vezes: um barzinho, com amigos e amigos de amigos (com quem eu não tenho a menor intimidade ou mesmo que estou encontrando pela primeira vez)...
Alguém: cerveja, pessoal? um, dois, três...
Eu: pra mim não, obrigada
Alguém: Ué, por quê?
Eu: não bebo. Quero um suco de laranja, por favor.
Alguém: Como assim? Vai beber suco de laranja?
Eu: Vou, ué, por quê?
Alguém: Coisa chata. Todo mundo tomando cerveja e você vai pedir um suco de laranja?
Eu: Vou.
Alguém: Que isso? Toma uma cervejinha aí, pra relaxar, ficar mais alegre,...

Essa é a hora em que eu começo a fazer cara feia. Não porque não existe álcool no meu sangue para me fazer uma pessoa feliz e relaxada, mas porque tem um mala me enchendo a paciência, como se a cerveja dele fosse chocar só porque o meu pedido foi diferente. Ai,... Não tenho paciência! E o pior: geralmente é alguém a quem eu não dei a menor confiança, a menor abertura pra palpitar assim na minha bebida.
Se o tal cidadão tivesse ficado na dele e bebido sua cervejinha, nós todos teríamos terminado a noite felizes, conversando animadamente, ele e o resto da mesa com sua cerveja, eu com o meu suco de laranja. Mas não, ele tem que vir me dizer que eu tenho que fazer como todo mundo faz porque..... é isso o que todo mundo faz. Mal sabia ele que essa é uma das coisas que mais rapidamente acabam com o meu bom humor.
Não, essa Maria não vai com as outras. Nunca foi. Por personalidade e por educação.
Eu fui educada para não fazer as coisas só porque todo mundo faz. Meus pais certamente tinham o propósito principal de evitar que eu fizesse coisas erradas só porque alguém fez, mas acabou servindo para tudo. Agradeço imensamente a eles por isso e espero conseguir ensinar o mesmo aos meus filhos: que façam bom proveito do seu livre arbítrio. Afinal, tem coisas na vida que a gente tem que fazer, mas tem muitas coisas que a gente só faz se quiser. E fazer só para agradar os outros, para provar algo a alguém ou fazer parte de um grupo, geralmente, é a coisa menos inteligente que uma pessoa faz.
Apesar disso, estranhamente, todos os dias milhões de pessoas o fazem. Fumam "porque todo mundo fuma", experimentam "porque todo mundo experimenta", transam "porque todo mundo transa" ou bebem "porque todo mundo bebe", etc, etc.
É que, se você não segue o fluxo, tem que ficar se justificando. Vai ter um perguntando de seu pai não deixa, outro perguntando se é religião e um outro perguntando se você "tá com medinho". E tem bocoió que cai na pilha.
Dica: você não precisa se justificar. "Não estou a fim" é o suficiente para encerrar o assunto.
Afinal, eu não peço para ninguém deixar sua cervejinha de lado e me acompanhar num delicioso suco de laranja!

domingo, 19 de agosto de 2012

Quer saber da minha vida? Então faça parte dela!

Minha amiga Ligia recentemente esteve na Itália e me mandou um postal, que encontrei na minha caixa de correspondência na última semana. Ela tinha feito o mesmo quando de sua viagem ao Japão, mas acho que desta vez não cheguei a dizer-lhe que o recebi e o quanto fiquei feliz em recebê-lo, por isso peço licença para registrá-lo, agora: Lili, eu amei a surpresa!
Para minha querida amiga Mariana, que coleciona postais enviados pelos amigos viajantes, eu enviei um de cada país que visitei - alguns escritos a "quatro mãos", em parceria com amigos em comum. Ela, claro, fez o mesmo em suas viagens.
Receber um cartão postal é o mais próximo de receber uma carta a que chegamos nos dias de hoje. Já não se escrevem cartas contando as novidades ou dizendo ter saudades. Talvez já não se sinta tanta saudade com tantas opções tecnológicas para enviar fotos, vídeos, e mesmo conversar "ao vivo", em videoconferência.
Me sinto uma velha dizendo isso, mas essa geração não conhece a felicidade de abrir a caixa de correspondência e achar algo mais que contas. Seja o cartão que chega de surpresa, seja a resposta a uma carta que se espera ansiosamente.
Receber um postal causa a mesma alegria que receber uma carta e receber uma carta não é como receber um e-mail. Não é como ter uma nova publicação no seu mural ou o comentário de um seguidor no twitter. A carta tem personalidade. Desde o papel até a caligrafia de quem a escreveu - e mesmo as rasuras no texto -, a carta parece nos deixar mais próximos de quem a enviou. A carta permite um contato físico, é como a diferença entre folhear um livro e lê-lo na tela do computador.
Quando eu era mais nova e o computador não era usado para mais do que trabalhos escolares, costumava trocar cartas com alguns amigos. Uma amiga, em especial, era conhecida apenas por cartas. nunca nos encontramos. Outro, conheci somente algum tempo depois de começarmos a nos corresponder.
Com minhas amigas gaúchas troquei cartas que chegavam a ter resposta na caixa do correio já no dia seguinte ao seu envio (se pusesse a carta no correio de manhã, ela chegava no mesmo dia).
Em todos os casos, a frequência com que nos dávamos notícias caiu consideravelmente quando começamos a fazê-lo por e-mail e mais ainda quando apareceram as redes sociais.
Eu não desmereço as redes sociais. Juro que não. Elas te dão a vantagem de poder procurar pessoas que não vê há tempos, com quem perdeu contato e de quem, dificilmente, conseguiria o endereço ou telefone se não houvessem amigos em comum. De quebra, pode descobrir um pouco do que aconteceu em suas vidas nesse meio tempo. Se casou, se teve filhos, se foi morar em outra cidade. Quase nem precisa marcar um encontro para colocar as novidades em dia. Dependendo dos filtros e bloqueios do perfil pesquisado, você nem precisa que o outro aceite um pedido de amizade seu. É fácil, rápido, e... superficial.
Não sei se é porque eu nunca fui "popular" mesmo ou se por temperamento, mas não vejo muita utilidade em "colecionar" contatos. Não tenho um milhão de amigos, não adiciono gente que não conheço e não saio adicionando todo mundo a quem sou apresentada. Mais ou menos regularmente, faço uma "limpa" na minha lista de amigos e retiro aqueles com quem não existe interação frequente. Me dá um nervoso pensar que o que coloco na rede para dividir com os meus amigos, um monte de outras pessoas - que não estão, necessariamente, interessadas no que eu tenho a dividir - verão também. São fotos pessoais, comentários pessoais, opiniões pessoais. Não é como um post no blog, escrito para todo mundo ler. O que eu posto no facebook é para os meus amigos e familiares verem. Só.
Isso quer dizer o seguinte: se você descobrir que não está mais entre os meus amigos, não fique magoado. Não quer dizer que eu não vá com a sua cara, apenas que não conversamos. Você, provavelmente, nem lembra que eu estou ali ou entra no meu perfil de vez e quando somente para olhar o que há de novidades. Não conversa, não comenta, não curte, não dá notícias suas. Talvez me dê os parabéns no meu aniversário, mas não passa disso.
Eu, provavelmente, faço o mesmo com você. E como acho isso meio doentio, prefiro removê-lo da minha lista de amigos. Não é algo irrevogável. Não há magoa nisso. Apenas, por algum motivo, nos afastamos. Isso já aconteceu com outras pessoas em nossas vidas e certamente voltará a acontecer com outras mais. No momento em que de alguma forma nós nos reaproximarmos, podemos novamente ser amigos virtuais.
Acontece que, se estivéssemos nos tempos das cartas, você não saberia nada da minha vida sem falar comigo, então por que, virtualmente, o negócio tem que ser diferente?

terça-feira, 14 de agosto de 2012

o fim do longuete

No início do mês, eu e mamãe fomos às compras. O objetivo era encontrar o vestido da mãe da noiva. Minha mãe não queria um vestido longo, uma vez que a festa será no jardim de casa - "vai arrastar no chão e estragar a barra do vestido", ela dizia - portanto saímos em busca de um longuete.
O primeiro desafia foi convencer as vendedoras de que a noiva estava de acordo que a mãe não usasse um longo. Imagina! Que absurdo! A mãe da noiva tem que estar de longo! E nós explicávamos, uma vez mais, que o casamento era no jardim de casa, num clima mais informal, e que eu - a noiva - estava, sim de acordo com o comprimento desejado por minha mãe.
Aí vinha a parte difícil: achar um vestido longuete. Aparentemente já não existem vestidos nesse feitio. Coisa rara. Vestido, hoje em dia, ou é longo ou é curto. Bem curto. Minivestido.
Sim, porque "na minha época", o longo era até os pés, o longuete no meio da panturrilha, o curto na altura dos joelhos e o mini no meio da coxa. Do tamanho que se usa hoje é micro.
Eu mesma já tinha passado por esse problema um mês antes, procurando um vestido para um casamento, como convidada. Ou longo ou curto. Acabei com um longo porque achei um vestido lindo remarcado, mas até aí estava bem frustrada. Queria algo na altura dos joelhos, mas mais pra baixo. Achei um ou dois modelos para experimentar, só. Sem "margem de erro" para um caimento que não fique bom, um preço acima do previsto ou uma cor que não lhe favoreça.
Minha mãe voltou para casa com um vestido curto, logo acima dos joelhos, mas ainda elegante e digno de uma senhora de seus cinquenta anos. Ficamos as duas satisfeitas, mas esse achado não foi feito em uma loja de vestidos de festa.
Na verdade, eu cheguei a discutir com a vendedora de uma das lojas, que insistia em dizer que a arara que nos mostrava era a dos longuetes, que "eles agora vinham nesse comprimento mesmo", na altura dos joelhos. Me irritou profundamente! Os vestidos eram do tamanho de uma blusa mais compridinha, minha. Mesmo em uma moça mais baixinha, ele ficaria curto, mas na minha mãe... será que a vendedora realmente achou que minha mãe usaria um vestido daqueles? nem eu usaria um vestido daqueles!
A questão é: quem foi que decidiu que eu tenho que me vestir feito a Suellen? O que aconteceu com as roupas que cobrem o suficiente dos nossos corpos para que fiquemos confortáveis em qualquer situação? É a moda. Só se vende saia curta. Bem curta!
É a moda? Será que não dá pra se fazer uma moda mais democrática? Uma moda para todos os gostos, corpos e idades?
Encontrar roupa para trabalhar é um custo. Até os modelos sociais estão encurtando. Encontrar um vestido com o qual se possa sentar e abaixar sem mostrar mais do que se deve é desafiador! A saída, quase sempre, é ir de calça. Ou de longo, enquanto ele ainda existe.

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

abaixo as senhoritas

Um tempo atrás, não me lembro como, eu cheguei a um artigo sobre um movimento das feministas francesas para que se acabasse com o pronome Mademoiselle. Segundo as moças francesas, essa diferenciação entre a mulher solteira (mademoiselle) e casada (madame) - que não existe entre os homens - e a consequente diferença de tratamento que ela insinua, é uma das mais enraizadas "tradições" machistas da nossa sociedade, visto que, como alega o grupo Osez le Féminisme:

"transmite a impressão de que uma mulher só alcança sua plenitude depois de casada, quando, então, a 'madame' (senhora) se iguala ao 'monsieur' (senhor)". (http://operamundi.uol.com.br/conteudo/noticias/20057/franca+abandona+termo+mademoiselle+em+documentos+publicos.shtml)

À primeira vista, pode parecer besteira, coisa de quem fica procurando chifre em cabeça de cavalo (como aliás, se diz de tudo o que é considerado "feminista"). O fato, no entanto, é que a privacidade da mulher era invadida, a condição de seu relacionamento (ou a não existência dele) exposta, enquanto, em momento nenhum, ninguém se metia na vida dos homens. Não interessava a ninguém se o sujeito era solteiro, enrolado, casado, "juntado" ou desquitado. O tratamento era o mesmo. Somente a mulher era obrigada a informar seu estado civil, mesmo que indiretamente, ao ser perguntada se mademoiselle ou madame.
Sim, era. Não é mais. Em fevereiro, o gabinete do primeiro ministro anunciou que o termo não pode mais ser utilizados em documentos públicos. Ponto para elas. A luta das feministas, agora, é para convencer as empresas privadas a seguir o exemplo.
É possível que você, lendo isto, pense: "oras, mas que mal tem isso? Sempre foi assim e ninguém nunca reclamou antes! Até parece que isso vai resolver todos os problemas, banir o machismo da face da Terra. E até parece que essa mulherada não vê que tem um monte de coisas muito piores acontecendo por aí!"
Acontece que, primeiro: um monte de coisas que "sempre foram assim" só deixaram de "ser assim" porque alguém brigou por isso. E o fato de sempre terem sido assim não significava que eram boas. As mulheres não votavam, não trabalhavam fora, não estudavam. Não escolhiam sequer seus maridos. E precisavam estar sempre sob a "custódia" de um homem ou serem castas viúvas para serem respeitadas (basta assistir a alguns capítulos de Gabriela para ver como as coisas funcionavam nem faz tanto tempo assim).
Sempre tinha sido assim e continuaria sendo se alguém não tivesse brigado pela mudança. E essa iniciativa, com certeza, não seria tomada por um homem, pois que a vida deles estava muito confortável do jeito que sempre tinha sido.
Em segundo lugar, o machismo e todos os preconceitos e atrocidades que dele derivam não serão extintos de uma hora para outra. É preciso dar um passo de cada vez. E o passo que as francesas deram é, a meu ver, muito importante, sim, se você olhar para a frente. As futuras gerações não conhecerão a diferença de tratamento entre uma mulher solteira e outra casada como a conhecemos e, assim sendo, não farão essa distinção. E é assim que se acaba com um "pré-conceito".
Da mesma forma como para nós, hoje, é óbvio trabalhar, votar, dirigir e tantas outras coisas que nossas antepassadas tiveram que brigar muito para conseguir, para os filhos dos franceses será óbvio que um homem é um homem (e será chamado monsieur) e uma mulher é uma mulher (e será tratada por madame), independentemente de seu estado civil. Eles até saberão que essa diferença existiu um dia, mas ela não fará parte da sua realidade.
Acho a iniciativa louvável.

quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Você é bom?

Eu fui criada muito mais dentro do espiritismo que de qualquer religião. É nele que estão todas as coisas em que eu acredito e é por causa dessas coisas que eu tento ser uma pessoa sempre melhor. Eu acredito que se fizer e pensar o bem, fico cercada de boas energias e, consequentemente, mais protegida das más energias (que algumas pessoas cismam em emanar pra cima e mim). Eu acredito que as pessoas têm uma missão na vida, lições a aprender e que todos, mais cedo ou mais tarde - nesta ou em outra encarnação - pagarão por seus maus atos, sem que eu precise mover uma palha. Assim sendo, ficar desejando o mal do outro só atrapalha a mim mesma. "Retarda a minha evolução espiritual", como eu costumo dizer. É perda de tempo. Tempo que, aliás, poderia e deveria ser usado para algo mais construtivo que desejar o mal alheio.
Ainda assim, tem vezes que eu fico que nem a Chayenne, pensando "exploda, ser do pântano, exploda". É que tem gente, meu amigo, que no mínimo uma dor de barriga você devia ter o direito de desejar!
Não importa qual seja a sua religião, ela provavelmente vai dizer que você deve ser uma pessoa boa, amar e perdoar o próximo e fazer o bem. Isso provavelmente significa desejar o bem também. Quanto melhor você for de coração, maior será a sua recompensa (especialmente porque se você for bom de verdade não estará pensando em uma recompensa por isso. A falsa bondade não redime ninguém). E o mais incrível é que, aparentemente, tem gente que consegue mesmo ser assim!
O Lulu Santos disse em sua música que "não desejava mal a quase ninguém". Quase. Ninguém, ninguém mesmo, é muito difícil! Requer muito desapego, muita fé, muito... sei lá. Eu não sei como é isso.
Eu, assim como o Lulu, não desejo mal a quase ninguém. E quando desejo, juro que não é muito mais que aquela dor de barriga. Mesmo assim, eu me envergonho, porque no fundo do meu coração eu queria ser uma dessas pessoas boas que tudo relevam, que dão a outra face. 
Acontece que, aparentemente, a minha evolução espiritual ainda não chegou nesse nível. Eu sou do tipo que guarda mágoa, que demora a esquecer. E se não gasto mais tempo desejando o mal aos meus desafetos, por outro lado, não consigo não ficar feliz quando sei que eles se deram mal de alguma forma. Aquela sensação de "bem feito! Agora teve o que merecia". É horrível, mas é bom. E eu me pergunto como aquelas outras pessoas conseguem ser tão boas que nem essa alegriazinha sintam? Como se compadecem dos que jamais se compadeceriam delas? Será que eu sou uma pessoa ruim? 
A minha terapeuta diz que não. Diz até que eu tenho o direito de sentir raiva e que essa "alegriazinha" faz parte do ser humano. Tomara, porque eu acho que vou precisar de umas cinco encarnações pra compensar a alegria que senti com umas coisas fiquei sabendo na semana passada...


quarta-feira, 1 de agosto de 2012

O talento que o mundo não viu

Nos primeiros anos da minha infância, eu e meus primos maternos nos encontrávamos quase que exclusivamente nas férias e, algumas vezes, na semana santa. Nessas ocasiões, criávamos montávamos, ensaiávamos e apresentávamos espetáculos para a família. Minha tia, professora de artes, sempre tinha em casa restos de papéis coloridos, brilhantes, lápis de cor, folhas e tudo mais que precisávamos para nossas grandes produções, geralmente comemorativas de natal, páscoa ou ano novo. Eram teatrinhos, musicais, apresentações de ginástica ou algum "programa de variedades", que normalmente começava com uma ideia, passava por uma briga minha com a minha prima e terminava com meu primo rindo sem parar de alguma coisa que acontecia durante a apresentação e meu irmão ficando revoltado porque a falta de concentração dele tinha estragado tudo! E saía do "palco" emburrado, apesar dos aplausos da plateia familiar.
Acho que devíamos todos ter ido parar num curso de teatro.
Aliás, minha mãe devia ter me colocado na aula de teatro na primeira vez em que me colocou de castigo.
Se eu tivesse ficado de castigo mais vezes, talvez nem de aula de teatro precisasse, mas eu era uma menina boazinha e ficar de castigo não era uma rotina na minha vida. Além disso, aconteceu algumas vezes de eu ficar de castigo apenas fechada no quarto, podendo assistir televisão ou desenhar, e isso resolvia o problema.
Mas quando eu estava de castigo mesmo, sozinha no quarto, sem maiores distrações, aí o negócio era legal. Aí toda a minha imaginação se fazia presente, e em segundos eu virava a princesinha sofredora, presa na masmorra da  mais alta torre do castelo. Eu juro que não era chantagem emocional, e que eu não fazia de propósito pra deixar minha mãe com remorso, mas lá estava eu, no quarto, a voz chorosa, em monólogo:
"Eu era tão feliz! Antes eu podia andar livre por aí e agora estou aqui! Presa! Acorrentada! Blá, blá, blá..." Não sei se tinha um texto pronto que se repetia ou se eu inventava um na hora, mas devia ser sempre bem parecido com a Cinderela sendo trancada no quarto pela madrasta má quando chegam os comissários do rei com o sapatinho de cristal, na esperança de encontrar a dona do pezinho que apaixonou o príncipe.
Uma gritaria de desespero, uma choradeira, uma lamentação... rapidinho minha mãe se enchia daquela ladainha e eu estava liberada do castigo!
Aí eu acho que perdia a graça... Porque eu já estava ali, personagem incorporado, emoções à flora da pele.
Por isso eu acho que ela devia ter me colocado na aula de teatro. O talento para o drama eu já tinha comprovado e provavelmente teria me ajudado a vencer a timidez, de forma que o grande público - e não apenas a família, teria a chance de ver todo aquele talento que transbordava nos meus momentos a sós. O "grande público" nunca chegou a saber o que perdeu...
Em 1991, nós morávamos em São Leopoldo (RS) e a escola em que eu estudava fazia, mensalmente, uma espécie de "dia de talentos". Cada série preparava um pequeno espetáculo - podia ser uma peça, uma música, qualquer coisa - para apresentar. Num determinado mês, as professoras da minha série decidiram que um aluno declamaria um poema gaúcho. Distribuíram o bendito poema (de pelo menos umas seis estrofes longas) aos alunos e esperaram pra ver, ente os que o decorassem todo, quem iria apresentá-lo.
Eram duas turmas. Eu fui a única a decorar o bendito poema. As professoras me pediram quase de joelhos que declamasse os tais versos, mas foi em vão. A vergonha falou mais alto e ninguém ia me convencer a subir naquele palco, diante de todas as turmas da manhã, e dizer uma palavra. Muita gente! Muito alto! Foi uma outra menina e declamou só as primeiras estrofes.
Nos anos seguintes, sempre que tinha peça de teatro na escola eu era a primeira a me candidatar. Para os bastidores. Criava cenários, arrumava figurinos, até trilha sonora eu cheguei a fazer, mas tinha calafrios só de pensar em ir para o palco. Sabia todas as falas, de todos os personagens, decoradas, e ficava arrasada quando os colegas esqueciam as suas em cena, mas não ia.
Apresentar trabalho não era problema, dar recados como representante de turma não era problema, mas interpretar... Essa vocês perderam.