domingo, 24 de junho de 2012

para pés de todos os tamanhos

Passeando por uma livraria do centro da cidade, uns dias atrás, me deparei com o livro "Nunca case com uma mulher de pés grandes", da holandesa Mineke Schipper. O livro chamou minha atenção por um motivo óbvio: eu calço 38/39 e pensei que, de repente, teria que evitar a todo custo que meu namorado chegasse perto dele. E avisar algumas amigas para que tomassem o mesmo cuidado.
Até onde o folheei, felizmente, o conteúdo parece não conter riscos e é, inclusive, bem divertido.
"Nunca case com uma mulher de pés grandes" apresenta uma compilação de provérbios de várias culturas relacionados à mulher e traz pérolas machistas que chegam a ser engraçadas de tão estapafúrdias. São mais de mil deles, falando sobre aspectos físicos e comportamentais das mulheres nas diversas fases de suas vidas: a filha, a esposa, a nora, a sogra, a viúva e até a mulher morta. 
Muito divertido, desde que você não os leve a sério.
Acontece que autora pretende justamente mostrar como esses provérbios se tornaram verdades para essas culturas e ditaram (e ainda ditam) comportamentos e preconceitos ao longo da História, tolhendo as mulheres e afirmando a suposta superioridade masculina. O provérbio título, por exemplo, é assim apresentado por Aline Leal, na orelha do livro:


"Nunca se case com uma mulher de pés grandes" é de origem sena e "atribui valor negativo à mulher que, em algum nível, supera o homem. Ela é insubordinada, perigosa e deve-se evitar tê-la por perto. Pode desestabilizar os papéis determinados a cada sexo em prejuízo da ordem estabelecida e, desse modo, rebaixar o homem em sua condição dominante".

Para os homens, isso faz todo o sentido: evite uma mulher que seja melhor que você. Escolha uma que você possa controlar e que não desafia a sua autoridade. 
Para as mulheres, no entanto, significa sufocar suas melhores características, significa: se quiser casar, ter filhos e ser aceita pela sociedade, se não quiser terminar seus dias sozinha e solitária, finja, pelo menos, ser menos esperta que os homens. 
Foi isso que as mulheres de muitas culturas fizeram por incontáveis gerações. E fizeram tão bem que começaram a acreditar nisso e subestimar a própria capacidade. Aceitaram e assumiram o papel de inferiores, de vítimas, de dependentes. Deixaram que homens, governos e religiões dissessem como deveriam viver e todas as coisas que não poderiam fazer.
Felizmente, sempre existiram as mulheres grandes. Grandes mulheres, nem sempre de pés grandes, mas que simplesmente não conseguem não pensar ou resignar-se a um papel pré estabelecido para si. Mulheres que insistem em ser o que são, apesar da reprovação, não apenas masculina, mas de outras mulheres, acostumadas a baixar a cabeça ante as convenções.
Um belo dia, algumas dessas mulheres se encontraram e viram que não estavam sozinhas. Resolveram que não mais fingiriam ser menos do que eram para agradar os outros. Queriam votar, estudar, trabalhar, ocupar cargos importantes. Queriam ser tratadas com igualdade de direitos e decidir seus destinos, porque o que lhe ofereciam seus homens não era suficiente para elas. Tiveram grandes em diversas culturas e sociedades (infelizmente não todas, ainda) e nos mostraram que não precisamos nos adaptar a um molde, nem enfaixar nossos pés, como as antigas chinesas, para que não cresçam.


5 comentários:

  1. Otimo Ju!
    Andei lendo muito sobre feminismo e é exatamente isso: os homens tem que ter tudo, até o pé "mais grande".
    Imagina um mundo em que as mulheres não fossem tolidas ou reprimidas ou viloentadas e pudessem ser tudo o que elas tem capacidade para ser. Seria lindo!
    Vamos juntar nossos pés 38/39 rumo a isso =D

    O mais engraçado é que os homens são tão inseguros que o tamanho de um pé muda sua auto confiança, é isso mesmo produção? rssss

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    1. Oi, Gabi,
      pois é, e é "8 ou 80". Ou a mulher não pode nada ou tem que ser tudo: profissional bem sucedida, dona de casa prendada, amante vaidosa e disposta e mãe presente. Aliás, se você reparar, o trabalho de casa, que continua sendo responsabilidade só nossa, na maior parte dos casos, serviu de moeda de troca, ou de prova de fogo para muitas mulheres que queriam trabalhar. Para que os maridos concordassem ou permitissem que elas trabalhassem, elas tinham que provar que a família e a casa não ficariam descuidadas, e nos deixaram esse triste legado: mesmo hoje em dia, poucos são os homens que dividem as tarefas de casa naturalmente. O normal é que um homem bem sucedido tenha um emprego e muito dinheiro. E ponto. A mulher bem sucedida, por sua vez, tem um bom emprego, dinheiro, uma casa bem cuidada, um marido feliz e filhos bem criados, está em forma e não sai de casa sem maquiagem. Falta muito pra essa igualdade aparecer...

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  2. Lembrava que vc tinha escrito um post relacionado aos pés grandes!!!

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  3. "Ela é insubordinada, perigosa e deve-se evitar tê-la por perto." - Nossa, descreveu direitinho minha personalidade e meus pézinhos 38/39! Wahahaha... o mais engraçado é que são estas características que fazem as pessoas se aproximarem de mim, as que valem a pena ter por perto, é claro! As que não gostam são repelidas automaticamente, o que acaba sendo uma benção, né não?
    porque as Cinderelas às avessas como nós, caminham pra onde querem, sustentadas por pés firmes que sabem caminhar!
    Beijos

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    1. Os pés pequenos podem ficar com os sapatinhos de cristal, né, Onçana? Pés como os nossos são para botas de sete léguas

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